Buscando adequar-se aos
compromissos assumidos em convenções internacionais, o Brasil adotou, em 2015,
a audiência de custódia, que é um dos temas mais discutidos no momento na área
do Direito Processual Penal.
Embora seja relativamente nova
no âmbito doutrinário e jurisprudencial brasileiro, a audiência de custódia já
é uma prática consolidada em muitos países ocidentais.
Ela ganhou destaque no Brasil
a partir da sua implantação no Maranhão, pelo Tribunal de Justiça (TJMA) e pela
Corregedoria-Geral da Justiça (CGJ) que, por meio dos provimentos 24/2014 e
14/2014, respectivamente, disciplinaram a sua realização, se inspirando no
positivo ativismo institucional da Unidade de Monitoramente e Fiscalização do Sistema
Carcerário (UMF), que defendeu sua
obrigatoriedade face ao caráter supralegal do Pacto de San José da Costa Rica e
do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos.
Como esses Tratados
Internacionais trazem matéria de Direitos Humanos, o Supremo Tribunal Federal
(STF) decidiu que os mesmos possuem força normativa supralegal, ou seja, estão
acima das leis, e abaixo apenas da Constituição Federal.
Parte importante da doutrina
defende que documento internacional que trate de Direitos Humanos assinado pelo
Brasil deve ser considerado como emenda constitucional, uma vez que os direitos
fundamentais previstos no artigo 5º da Carta Magna não excluem outros
decorrentes dos Tratados Internacionais, dos quais o Brasil seja parte.
O Supremo Tribunal Federal, no
entanto, adotou entendimento diverso, no sentido de que apenas adquire status
de emenda constitucional os documentos internacionais sobre direitos humanos
aprovados em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos
dos votos de seus membros.
Dessa forma, os outros
tratados internacionais que envolvam direitos humanos – não aprovados nesses
termos – teriam status supralegal, ficando acima da lei, mas abaixo da Constituição
Federal.
A audiência de custódia
consiste na condução do preso, sem demora, à presença de uma autoridade
judicial, que deverá – a partir de prévio contraditório estabelecido entre o
Ministério Público e a Defesa – exercer um controle imediato da legalidade e da
necessidade da prisão, assim como apreciar questões relativas à pessoa do
cidadão conduzido, notadamente a presença de maus tratos ou tortura.
O conceito dado à audiência de
custódia está totalmente vinculado à sua finalidade. Nesse caso, ela não pode
ser confundida com a mera “audiência de apresentação”, uma vez que funciona
como um instrumento de controle judicial imediato da prisão.
Embora seja essencial para
proteger e outorgar proteção de direitos, como a vida e a integridade pessoal,
há de se admitir que a audiência de custódia não elimina, sozinha, a tortura,
uma prática que atravessou todo o período ditatorial e que, infelizmente,
continua presente na democracia pós-Constituição Federal de 1988, agindo como
uma espécie de “sistema penal subterrâneo”, aprovada por considerável parte da
opinião pública, o que não deixa de ser preocupante.
Mesmo assim, não podemos
deixar de reconhecer que ela aumenta o poder e a responsabilidade dos juízes,
promotores e defensores de exigirem que os demais elos do sistema de justiça
criminal passem a trabalhar em padrões de legalidade e eficiência, se afastando
do arbítrio e estabelecendo limites legais ao exercício do poder punitivo.
Num país onde as
penitenciárias estão lotadas, com um número significativo de pessoas presas
preventivamente, a audiência de custódia se apresenta como medida relevante,
submetendo a legalidade de prisões ao crivo judicial, colocando frente a frente
o juiz e o preso, que é uma prática muito diferente da análise fria e distante
do auto de prisão em flagrante.
Por apressar a análise
judicial sobre a legalidade e necessidade da prisão, ela faz com que os
responsáveis pela prisão – sabendo que o preso logo será apresentado à
autoridade judiciária – sintam-se compelidos a não torturar, temendo pela
descoberta de seu crime, e consequente punição.
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