Transita no Planalto Central a sombra de um comando que evoca uma narrativa heroica sobre os crimes cometidos na ditadura militar, escondendo a verdade na tentativa de enterrar um passado não resolvido.
Há exatos 55 anos do Golpe Militar, o Brasil continua negando-se a prestar contas de um triste passado e desatar o nó que vem alentando o retorno da barbárie, o abuso de poder e outros instrumento intimidatórios.
O primeiro passo para efetivar a justiça exige fazer memória do acontecido. Sabe-se, por triste experiência, que a impunidade caminha na mão do esquecimento.
Os torturadores não querem acertar as contas com o passado e até hoje não assumiram os crimes de lesa-humanidade. Sabem eles que a melhor estratégia para ocultar a injustiça é seu esquecimento.
Para tanto, dissimulam a injustiça conexa perpetrada nos anos de chumbo. Ao atingir esse objetivo, cometem uma dupla injustiça contra as vítimas. A primeira no ato da violação e assassinato e a segunda no seu esquecimento.
De modo inverso ao esquecimento, a memória apresenta-se como práxis da justiça. Ela atualiza um passado de injustiça que nos interpela. O passado que os militares tentam negar pelo esquecimento, sobrevive como demanda de justiça para o presente.
A memória é uma forma de trazer uma justiça possível às vítimas da ditadura, com o reconhecimento de suas lutas. Trazê-las até nós como parte de nossa contemporaneidade é um ato de justiça e reconhecimento. Sabemos que isso é insuficiente, sem dúvida, porém necessário para os passos subsequentes.
Somente com a memória das vítimas da ditadura militar poderemos garantir justiça a todos aqueles que sofreram com a repressão, com a tortura. A verdade sobre o terrorismo de regime militar precisa vir à tona.
Não é plausível promover o esquecimento da barbárie praticada durante os largos anos de ditadura que, no engodo de proteger o Brasil da ameaça comunista, torturou e matou sem o menor constrangimento centenas de brasileiros.
Fala-se muito hoje em reconciliação da sociedade brasileira. Ocorre que para haver uma verdadeira reconciliação, faz-se necessário os autores dos crimes reconhecê-los como de sua autoria.
Não se deve confundir o perdão com o esquecimento. Assim seria uma nova forma de violência à memória e à história das vítimas torturadas pelo regime militar.
O fato de as vítimas do regime militar estarem mortas não muda a dignidade delas. Suas histórias de luta não se extinguiram com a morte. Como vítimas, elas continuam sendo credoras de uma justiça que o conjunto social ficou lhes devendo.
No momento, não há tema mais atual do que resgatar a memória, pois entender o passado como morto é o caminho mais rápido para eliminarmos nosso futuro. Trata-se de um momento importante para passar o Brasil a limpo.
O silêncio que segue impedindo acesso aos principais arquivos da ditadura alimenta uma das maiores dívidas com a sociedade. Os poucos arquivos abertos pela Comissão da Verdade foram todos remexidos, invadidos e desmanchados antes de se tornarem públicos.
Enquanto é negado à sociedade o acesso aos documentos, os militares abrem seus arquivos à pessoas escolhidas, para que a história seja contada da maneira deles.
Os militares costumam dizer que muitos documentos foram incinerados. Não é verdade. O que pode ter sido incinerado é o papel, mas os arquivos já foram microfilmados e hoje, provavelmente, estão digitalizados.
Enquanto é negado à sociedade o acesso aos documentos, os militares abrem seus arquivos à pessoas escolhidas, para que a história seja contada da maneira deles.
Os militares costumam dizer que muitos documentos foram incinerados. Não é verdade. O que pode ter sido incinerado é o papel, mas os arquivos já foram microfilmados e hoje, provavelmente, estão digitalizados.
Nas mãos do Exército, Marinha e Aeronáutica, os arquivos seguem inacessíveis até hoje. Por que esse pacto de silêncio? Medo! Covardia!
O general chileno Augusto Pinochet – ditador chileno de 1973 a 1990 – ainda estava vivo quando a história de tortura no seu governo começou a ser contada no Chile.
No Brasil, ninguém teve coragem de fazer isso. Nada aconteceu. Não tiraram o ônus da prova. Não bancaram a busca de corpos. Ao contrário, houve tentativas de impedimento, levando a sociedade brasileira a ter pouco interesse pelo passado triste e vergonhoso da nossa história.
No Brasil, ninguém teve coragem de fazer isso. Nada aconteceu. Não tiraram o ônus da prova. Não bancaram a busca de corpos. Ao contrário, houve tentativas de impedimento, levando a sociedade brasileira a ter pouco interesse pelo passado triste e vergonhoso da nossa história.
A Lei 9.140 (Lei dos Desaparecidos Políticos) concedeu uma indenização às vítimas do regime militar, mas não disse onde estão os corpos das vítimas, como morreram, quem matou e qual a punição aos responsáveis.
A história precisa ser contada honestamente, para que os torturadores não continuem a outorgar o perdão a si mesmos, mesmo com a memória dos mortos os interrogando com toda a veemência. .
Punir quem cometeu crimes contra a humanidade não se trata de vingança, mas de justiça. Punir torturadores significa fazer justiça tão somente.
Na Europa há toda uma conscientização sobre o que significou o Holocausto. Já no Brasil, os anos de chumbo da ditadura são maquiados, para dizer o mínimo.
A ausência do passado na consciência coletiva é o que vem alimentando discurso para a perpetuação da violência nos dias atuais.
A ausência do passado na consciência coletiva é o que vem alimentando discurso para a perpetuação da violência nos dias atuais.
"Não se deve confundir o perdão com esquecimento"
ResponderExcluirQue belíssimo texto, meu querido irmão. Parabéns!!!!
Quando seremos capazes de contar a nossa própria história, quando seremos capazes de seguir o nosso destino com independência, quando, quando...?
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