sábado, 5 de agosto de 2017

Os lírios não nascem das leis

Por Antonio Carlos Lua

Apesar do aviso de um dos mais influentes poetas do Século XX, Carlos Drummond de Andrade, que no poema ‘Nosso Tempo’, publicado em 1945, diz afirmativamente que "As leis não bastam. Os lírios não nascem das leis", deixando bem claro que os legisladores não decretam a felicidade de ninguém – sendo esta uma conquista e não uma dádiva – os brasileiros continuam acreditando que a solução para a crise brasileira passa apenas pela milagrosa reforma política.

Com um Congresso desmoralizado e partidos políticos que não representam ninguém, uma reforma política nesse momento não vai atender ao clamor da sociedade por mudanças nesse grande caldeirão de aprendiz de feiticeiro que não se preocupa com os efeitos colaterais de seus experimentos.

A reforma que nos apresentam é um arremedo e não oferece as mínimas condições políticas de passar o Brasil a limpo. Na atual conjuntura, ela beneficiará apenas a 'República de Temer', que tomou de assalto o Estado e agora controla o Congresso Nacional, manifestando uma característica absolutista como revelam os exemplos recentes e bem significativos desse resquício de poder imperial.
 
No projeto de reforma engendrado hoje no Congresso Nacional não se cogita sequer um debate sério sobre a falência dos partidos políticos, cuja atuação no Brasil vem resumindo-se apenas à defesa de interesses eleitoreiros com a prática do clientelismo em arranjos pragmáticos e casuísticos.

Esses partidos – que têm atuação duvidosa como canal de representação dos segmentos da sociedade civil – visam apenas os benefícios que a criação de legendas traz consigo, como, por exemplo, os recursos do Fundo Partidário e o direito a tempo de Rádio e TV, que hoje é uma preciosa moeda de troca em negociações eleitorais, capazes de garantir cargos e poder.

São legendas de aluguel, facções, grupos ambiciosos, fisiológicos, em busca do controle exclusivo de pedaços da “esfera pública” para suas clientelas, usando instrumentos retóricos para chegar ao poder, causando efeitos maléficos na política.

Nesse momento, só serve aos brasileiros uma reforma política que venha ser realmente a travessia para um regime legítimo, popular, representativo, que reconstrua a ordem constitucional-democrática comprometida com a emergência das massas. 

Certamente, ela não virá sem luta, pois é exatamente o processo da conquista que transforma o jeito de fazer política, alterando as correlações de força e não apenas fazendo a inserção de algumas combinações de palavras em folha de papel para se garantir um milagre diante de nossa tragédia continuada

Uma verdadeira reforma política dependerá da organização popular e de novas direções e comandos. A luta política democrática é o caminho para que a vontade popular de alterar as regras do sistema político possa vir a ser respeitada.

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