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sábado, 23 de março de 2024

O veneno em nossa mesa

ANTONIO CARLOS LUA

Dados da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO/ONU) apontam que o Brasil continua liderando o ranking dos países que mais usam agrotóxicos, embora não seja o campeão mundial de produção agrícola. Aprovados em grande escala, os agrotóxicos receberam o nome simpático de “defensivos agrícolas” e ganharam a afeição no país, que libera cada vez mais venenos na mesa do brasileiro.

O uso excessivo de agrotóxicos no Brasil para atender às demandas da agricultura de exportação, vem colocando o país – principal destino de pesticidas proibidas no exterior – como uma espécie de latrina tóxica com o uso de produtos comprovadamente nocivos, seja porque causam a contaminação de recursos hídricos seja porque também se mostram altamente prejudiciais à saúde humana.

Por que o Brasil lidera o ranking de uso de agrotóxicos? Temos mais pragas que os demais países? A ciência vem mostrando os imensos riscos dos agrotóxicos para as pessoas e para a fauna, mas, no entanto, os dados científicos não convenceram o Brasil em relação aos efeitos perversos dessas pesticidas na contaminação de rios e solos, constituindo-se uma ameaça à biodiversidade, gerando um debate emblemático para pensarmos o futuro da população no país.

Altamente maléficos, os agrotóxicos causam sérios danos ao ser humano, que vão desde alterações genéticas, como as malformações de embriões, até efeitos mais agudos. Eles estão presentes na nossa comida, na água que bebemos, no ar que respiramos e nos lugares em que nossas crianças brincam. Até mesmo nossas sementes melhoradas já são pensadas para usar agrotóxicos.

Os dados sobre o consumo de agrotóxicos usados na agricultura no Brasil são alarmantes. Imagine tomar um galão de cinco litros de veneno a cada ano. É o que os brasileiros consomem de agrotóxico anualmente, segundo laudo científico do Instituto Nacional do Câncer (INCA). Mais de 70% dos alimentos ‘in natura’ consumidos no país estão contaminados por agrotóxicos.

Desses alimentos – segundo a Anvisa – 28% contêm substâncias não autorizadas. Isso sem contar os alimentos processados, que são feitos a partir de grãos geneticamente modificados e cheios dessas substâncias químicas, que estão altamente associadas à incidência de sérias doenças genéticas.

O Brasil possui – desde a década de 1970 – legislações que regulamentam o registro, a produção, o uso e o comércio dessas substâncias danosas em seu território. Além da relativa frouxidão dessas legislações, exemplificada pela liberação de produtos proibidos em diversas regiões do planeta, a grande fragilidade está na fiscalização e nas medidas adotadas para que as normas sejam cumpridas.

Se formos mais a fundo nessa discussão, constataremos que é uma contaminação intencional. Em termos jurídicos, tem o crime culposo quando a pessoa não teve a intenção de cometê-lo e doloso quando essa

intenção fica provada e caracterizada. No caso em questão não é um crime culposo. Não é culpa do vento que mudou o agrotóxico de direção, mas do agricultor que cometeu um ato inseguro e intencional. Existe a intenção de poluir para atingir o alvo dele – no caso, os insetos, as pragas. Ele aceita conscientemente essa consequência.

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