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quarta-feira, 8 de abril de 2020

Máquina do ódio

Antonio Carlos Lua

O presidente da República, Jair Bolsonaro, quer fazer do coronavírus uma arma poderosa de desorientação em massa. Com um discurso movido pelo ódio e um nacionalismo torto e ultraliberal ele insiste em dizer que as mazelas vêm de fora e, no fundo, tenta passar a ideia de que se os idosos morrerem com a pandemia da covid-19 será um mal menor para o Brasil.

Mesmo num cenário dramático com milhares de pessoas mortas e infectadas pelo coronavírus, a máquina do ódio não para e tenta nos paralisar, nos atirar ao precipício, para deixar a esperança escondida, envergonhada e pisoteada por um ex-militar insano, que insiste em tripudiar uma pandemia que colocou o mundo de joelhos.

Com um ego avantajado alimentado pelos desvarios das forças ultraconservadoras de extrema direita, Bolsonaro odeia a liberdade e procura desesperadamente o aprisionamento da democracia.  

Ele prega o projeto de morte e representa hoje um perigo real para o Brasil. Dizer que o presidente da República passou dos limites virou lugar-comum. Faltam adjetivos para qualificar o seu delírio histérico de colocar o poder acima das regras da convivência civilizada.

Essa prática de sempre tem seus efeitos potencializados nas engrenagens políticas ultraconservadoras que – glorificando a Ditadura Militar que ensanguentou o Brasil entre os anos de 1964 e 1985 – se colocam hoje como a base de sustentação de um presidente estúpido que quer solapar a cidadania, lançando a sociedade na violência e na barbárie.

Mas o Brasil não pode institucionalizar a tirania – nem no Palácio do Planalto, nem nas ruas. É preciso tolerância zero com as atitudes de Bolsonaro, cujas posições desatinadas mostram uma hostilidade aberta contra a democracia, a imprensa e os direitos humanos.

Na sua possível insanidade, Bolsonaro se insurge contra as medidas do seu próprio governo, ou seja, é ele contra ele mesmo, num mundo circular fechado. Num caso típico de esquizofrenia, pediu o fim do isolamento social e disse que o ministro da Saúde, Luis Henrique Mandetta teria que se demitir. Feliz com a fama adquirida, o ministro não o fez e não o fará. Os ministros Paulo Guedes e Sergio Moro estão calados. São eles que contam para os setores dominantes. 

Enquanto isso, a Rede Globo troca claramente de lado. O Jornal Nacional e os analistas políticos da Globo News vêm dando luz verde sistematicamente ao Governo Federal. Mas Bolsonaro é burro e ainda não se deu conta de que os ventos mudaram.

O ímpeto geral das ações do presidente da República são de políticas que têm como consequência direta a morte. As principais medidas de sua gestão vão nessa direção, sendo a mais evidente a sua política para as armas, com a equação ‘Mais Armas=Mais Mortes’, com fortes efeitos potencializadores de violência.  

Podem ser mencionadas ainda suas ações contra os povos indígenas e quilombolas, o incentivo aos desmatamentos, à liberação de agrotóxicos, além da publicação do decreto que permite a impunidade ao proprietário de terra que mate ou mande matar trabalhadores rurais. Como explicar esta opção deliberada de Bolsonaro pela morte? 

Os setores populares precarizados que o apoiaram por esta agenda se tornaram vítimas do bolsonarismo armado e privilegiado pelo direito de matar, numa relação entre poder e violência, vida e morte, com o extermínio dos indesejáveis e daqueles que ousarem resistir. O assassinato de Marielle Franco – crime ainda sem solução – vem inserido nesta lógica.

Em sua campanha eleitoral, Bolsonaro tinha na mímica do pistoleiro, com o gesto de armas com as mãos, um claro apelo à violência. Aliado a uma retórica explicitando um conteúdo de ódio, ele provocou a emergência de uma violência política até então inédita no país. 

A milícia paramilitar nazista e as vítimas fatais como o capoeirista baiano, Mestre Moa do Katendê, assassinado por um eleitor bolsonarista em uma discussão política, mostram como estamos distantes de qualquer normalidade democrática.

O Brasil é um país secularmente violento. Fundado pelo ato cruel da conquista e do colonialismo português, o país, hoje – como Nação independente – conservou muitas das marcas da desigualdade e exclusão social do período colonial, tendo como evidência o fato de ter sido o último país da América a abolir a escravidão. 

Desta herança não é difícil apontar as raízes históricas que amparam o discurso violento e excludente de Bolsonaro, que remonta a lógica da ‘Casa Grande’ e, de forma mais direta, com a chamada “linha dura”, que passou por uma recente transformação ganhando ares civilizados, através do neoliberalismo. 

Esta vinculação entre o neoliberalismo e o autoritarismo está longe de ser fortuita. Nunca é demais lembrar que a primeira experiência de governo neoliberal foi implementada no Chile durante a sanguinária ditadura de Pinochet, a quem Bolsonaro presta elogiosas deferências. 

Existe um profundo distanciamento entre a razão neoliberal e a democracia. Nas ocasiões em que governos adotaram políticas neoliberais estas resultaram invariavelmente em algum nível de restrição democrática, com práticas imunes ao sufrágio popular.

O governo de Bolsonaro é uma versão radicalizada do neoliberalismo, cuja agenda inclui a promessa de privatizações generalizadas, abertura de setores estratégicos da economia do país para o capital estrangeiro – preferencialmente o norte-americano –, políticas de inversão econômica com restrições aos investimentos sociais, supressão de direitos e a ampliação da desigualdade social.

A política de Bolsonaro se orienta por um sentido geral de governo para os seus, não para a população brasileira. Com essa orientação, ele busca atender aos interesses corporativos de forma seletiva, potencialmente próximos ao espectro social que o elegeu, mas com um claro corte de classe, gênero e raça. 

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