O escritor e jornalista Machado de Assis – fundador da prosa moderna brasileira – tem uma obra genial, pela complexidade e sutileza, mantendo-se atual até hoje com temas clamorosamente contemporâneos.
Machado de Assis sentia uma profunda ligação com suas raízes e tinha algumas ideias interessantes e heterodoxas sobre o Brasil. O livro ‘Memórias Póstumas de Brás Cubas’ – publicado em 1881 – é considerado sua maior obra e uma das mais importantes em língua portuguesa.
Com seus enigmas, foi revestido de uma equivocada aura de leitura erudita – o que ele nunca foi em seu tempo, senão não teria publicado crônicas num português coloquial nos jornais onde atuou como jornalista e crítico literário
Em determinado momento da sua trajetória, Machado de Assis soltou a imaginação publicando ‘Brás Cubas’, um livro muito engraçado e nada convencional. Foi quando abandonou o moralismo e o esquematismo de seus primeiros romances, partindo para uma literatura mais livre na linguagem e mais rica nos temas.
Tanto ‘Brás Cubas’ como as demais obras de sua segunda fase vão muito além dos limites do realismo, apesar de serem normalmente classificadas nessa escola, mesmo tendo como características a introspecção, o humor e o pessimismo com relação à essência do homem e seu relacionamento com o mundo.
Há muitos elementos em sua obra explicados a partir de dados autobiográficos. A composição de personagens que fazem parte do imaginário brasileiro, como ‘Brás Cubas’ e ‘Quincas Borba’, carregavam traços do escritor, em seus posicionamentos como intérprete do comportamento humano de sua época.
Filho do descendente do escravo alforriado, Francisco José de Assis, e da imigrante portuguesa, Maria Leopoldina, que trabalhava como lavadeira, Machado de Assis, mesmo sem ter acesso a cursos regulares na escola, empenhou-se em aprender e se tornou um dos maiores intelectuais do país, ainda muito jovem.
Não obstante a posição elevada que ele assumiu durante seu surgimento na cena intelectual, houve uma série de críticos da época, enfatizando a biografia ou a raça do escritor.
Acusado de pouca brasilidade de possuir um estilo problemático, Machado de Assis ganhou certos rótulos redutores e injustos que não merecia e não merece. As afirmações nesse sentido tem um lado perverso, calcado em muitas acusações de omissão e indiferença frente aos problemas sociais de seu tempo, especialmente quanto à escravidão.
Dada a importância que as identidades étnicas e de gênero assumem na perspectiva dos estudos culturais, é necessário que sejam trazidas à tona as verdades sobre um escritor que mesmo sendo afrodescendente ascendeu socialmente, ocupando postos de prestígio num ambiente hostil às raças não-brancas.
Machado de Assis foi um analista e um crítico das instituições da sociedade e da política da sua época. Ele atacou as raízes das mazelas sociais e humanas protegido pela linguagem alegórica e pela agudeza da ironia, motivo pelo qual era lido principalmente por aqueles que constituíam o alvo maior de sua denúncia – as classes abastadas da elite imperial e depois republicana.
Não há uma linha sequer escrita por Machado de Assis onde defenda os senhores ou o direito de propriedade sobre seres humanos. Aos 21 anos, já em seus primeiros escritos, ele se posicionava contra o horror da instituição do cativeiro. Foi, portanto, um abolicionista. Muitas vezes, suas insinuações tomaram o lugar da denúncia explícita, do repto, da acusação bombástica.
O fato é que, no tocante às relações entre brancos e negros, Machado de Assis não adota nem o discurso cristão do bom senhor e nem o discurso do Positivismo ou do Cientificismo darwinista, que rebaixa negros e mestiços como “raça inferior”.
Mesmo sofrendo pesadas críticas em várias obras suas, não adotou em seus textos os estereótipos que rebaixam e aprisionam os afrodescendentes em imagens deturpadas e preconceituosas.
O lugar da fala machadiana é o do ‘Outro’, do discurso contra-hegemônico. Nas crônicas e poemas como “Sabina” e “13 de maio”, ou nos contos “Pai contra mãe”, “Mariana”, “O caso da vara” ou “Virginius”, fica evidente a elevação dos afro-brasileiros a uma posição de dignidade e respeito.
O mesmo ocorre em algumas cenas de ‘Brás Cubas’, ‘Helena’ e outras obras. A poética comanda a construção da maioria dos escritos, voltados para a carnavalização e desconstrução das elites brancas e de seus pontos de vista. Nesse contexto ganha destaque a recorrência do tema da morte do senhor, presente em vários romances como indicador da decadência do patriarcado escravista.
A grande diferença para Machado de Assis estava nos meios de comunicação. Na arena ideológica de seu tempo, tendo consciência da perenidade do produto jornalístico, utilizou bastante da imprensa como arma formadora de opinião, escrevendo textos no calor da hora dos acontecimentos, seguindo o ritmo acelerado imposto às redações nos jornais.
Homem contido, tímido, Machado de Assis jamais seria capaz de subir ao palco para discursar em defesa do abolicionismo. Mas, à sua maneira, ele participou da sociedade abolicionista e escreveu nos jornais muitas páginas memoráveis sobre a questão.
Machado de Assis não tinha delírios de grandeza. Isso permitiu que ele observasse todas as classes sociais de sua época, com todos os seus paradoxos. Não aderiu a nenhum dos credos cientificistas do seu tempo.
Teve influências francesas e britânicas (Shakespeare,Sterne) e alemãs (Schopenhauer), para não falar das brasileiras (José de Alencar), de Cervantes e de Leopardi.
Essas influências contribuíram na criação da prosa moderna brasileira e o ajudaram a adotar um estilo original, que vai além de uma combinação delas. Inspirado em Leibniz, em seu conceito de “mônada” criticado por Voltaire – um dos seus ídolos – Machado de Assis tinha um pessimismo parecido com o de Schopenhauer.
Essas influências contribuíram na criação da prosa moderna brasileira e o ajudaram a adotar um estilo original, que vai além de uma combinação delas. Inspirado em Leibniz, em seu conceito de “mônada” criticado por Voltaire – um dos seus ídolos – Machado de Assis tinha um pessimismo parecido com o de Schopenhauer.
Nos intriga hoje o fato de um escritor do século XIX, vivente numa sociedade imperial defasada em termos de progresso, escravocrata e de rígidos padrões sociais e morais, tenha adquirido tamanha estatura universal. É por isso que sua obra carece, pois, de estudos condizentes com sua relevância literária, para nos fornecer uma visão completa de seu conjunto.
Ultimamente, Machado de Assis vem sendo recuperado como escritor, inclusive com o relançamento de toda sua obra, que é síntese e corolário do processo histórico evolutivo da literatura nacional e eixo de um equilíbrio dinâmico da própria língua literária brasileira, sendo inevitável mais pesquisas para as diversas nuances da sua obra.
Seus textos permanecem atuais até hoje, atendendo a distintos horizontes. É um nome essencial para se compreender diversos aspectos da literatura brasileira. Estudos atuais focam o aspecto da afrodescendência em Machado de Assis.
Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, no Rio de Janeiro. Um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras e seu primeiro presidente, só se tornou um escritor conhecido a partir de 1872, com a publicação do romance ‘Ressurreição’.
Machado de Assis nasceu em 21 de junho de 1839, no Rio de Janeiro. Um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras e seu primeiro presidente, só se tornou um escritor conhecido a partir de 1872, com a publicação do romance ‘Ressurreição’.
Muito bom, meu nobre!
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