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domingo, 25 de fevereiro de 2018

Perdão Judicial

Por Antonio Carlos Lua

Desde o perdão de pena concedido, em 2016, ao ex-ministro José Dirceu, aos deputados Genoíno Neto, João Paulo Cunha, Roberto Jefferson, Valdemar Costa Neto, Romeu Queiroz, Pedro Henry, Bispo Rodrigues, e ao ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares, pelo Supremo Tribunal Federal – em decisão do ministro Roberto Barroso, a pedido do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que reconheceu indulto aos sentenciados por força do decreto assinado pela ex-presidente da República, Dilma Rousseff – a discussão sobre o Perdão Judicial vem ganhando novos contornos no Brasil, com posicionamentos divergentes sobre a natureza jurídica deste instrumento.

O Perdão Judicial – uma hipótese de extinção da punibilidade prevista nos artigos 107, IX, e 120, do Código Penal – sempre foi um tema polêmico, fruto de muitas controvérsias que se desenvolveram progressivamente na doutrina e na jurisprudência quanto à sua aplicação. 

Na legislação brasileira não existe um conceito para o Perdão Judicial, surgindo com isso opiniões diversas sobre sua natureza jurídica, seus efeitos e a sentença que o instrumento concede. 

Introduzido no ordenamento jurídico brasileiro, em 1940, o Perdão Judicial foi tratado com pouca importância até 1977 pela falta de previsão na legislação que o antecedeu. Somente com a promulgação das Leis nº 6.416/77 e nº 7.209/84, ele passou a ser visto com mais atenção. 

Entretanto, o seu momento mais importante na escala evolutiva veio com a Lei nº 9.807/99, quando ganhou amplitude e passou a ser aplicável a qualquer crime existente em nosso sistema de Justiça.

Muitos juristas definem o Perdão Judicial como instituto jurídico pelo qual o juiz – reconhecendo a existência de todos os elementos para condenar o acusado – não o faz, declarando o mesmo não passível de pena, para evitar um mal injusto através da individualização e estudo do caso concreto, vinculado à determinadas circunstâncias.

É quando o resultado causa tanto sofrimento para o réu que a punição se torna desnecessária. O juiz, não obstante a prática delituosa do réu, não lhe aplica pena, levando em consideração determinadas questões, tendo a certeza que ele não tornará a cometer o ato ilícito, extinguindo assim a punibilidade da conduta.

Até hoje, os juristas ainda não encontraram uma solução pacífica sobre qual o nome da sentença que concede o Perdão Judicial. Alguns defendam ser uma sentença condenatória, outros, absolutória. 

Os defensores da sentença absolutória entendem que concedido o perdão, não irá subsistir os efeito principais, (pena ou medida de segurança), nem os secundários (lançamento do nome no rol dos culpados, pagamento pelas custas). A sentença não poderia ser condenatória, posto que não condena ninguém, não atribui pena, apenas perdoa. 

Já os defensores da sentença condenatória dizem que ela jamais poderia ser absolutória, porquanto, só absolve quem não tem culpa, e se não errou não tem o que perdoar. 

Há ainda quem acredite ser ‘terminativa de mérito’ a sentença que concede o Perdão Judicial, pois ela não irá declarar nada, não irá absolver nem condenar ninguém, só irá colocar fim ao processo, impedindo novo julgamento sobre o mérito do litígio penal, extinguindo-se a punibilidade. 

Não obstante a todos esses entendimentos o que realmente vem prevalecendo é a Súmula nº 18 do Superior Tribunal de Justiça, cujo entendimento é de que a sentença que concede o perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório.

Muito se discute também acerca da nomenclatura adotada para o Perdão Judicial. Uma corrente de juristas considera o termo inadequado por entender que ele não é um ato de perdão concedido pelo juiz e essa afirmação leva as pessoas a raciocínios não rigorosamente verdadeiros ou lógicos. 

Os especialistas que se inspiram no Direito Germânico adotam a terminologia “dispensa de pena” ou “isenção de pena”. 

Tudo indica que o Perdão Judicial se inspirou no Código Italiano, fonte tradicional do nosso Direito punitivo. Remonta-se também a origem do Perdão Judicial ao Instituto da Graça, tendo como marco inicial a separação dos Poderes com a Revolução Francesa.

Outro instituto que se assemelha ao Perdão Judicial se chama Perdão do Ofendido, que é concedido em crimes de ação penal exclusivamente privada, manifestado a qualquer tempo e, uma vez aceito, extingue a punibilidade (Artigos 105 e 106 do Código Penal). 

A Graça era a manifestação de um Poder absoluto e incondicionado, onde toda a Justiça advinha do Soberano. Desta forma, cabia somente ao Rei – ou a alguém que este indicasse – o poder de julgar. 

Todavia, o Soberano tinha também o poder de perdoar, denominando-se essa faculdade como “Clemência Real”, que acontecia de diversas formas, como a revisão, graça, anistia, reabilitação.

Alguns doutrinadores afirmam que o Perdão Judicial existe desde a antiguidade, sendo utilizado pelos hindus, egípcios, hebreus e persas. Entretanto, muitos especialistas divergem dessa afirmação, por entenderem tratar-se de um instituto que não tem história, estando presente sempre entre os povos. 

Muitos vislumbram a origem do Perdão Judicial em Roma. Há ainda os que defendem construir a origem do instituto no ‘Livro V das Ordenações Filipinas’. Tem aqueles também que apontam a origem do Perdão Judicial no Direito Canônico. 

Na comunidade jurídica, há também uma corrente de doutrinadores que vislumbra a presença do Perdão Judicial apenas nos tempos modernos. 

Há ainda aqueles que negam qualquer história sobre ele, sob o argumento de ser o instituto um produto do progresso da psicologia, do cuidado que o Estado moderno põe na educação dos menores e daquela tendência de civilização pela qual o Poder estatal se preocupa não só do castigo da delinquência senão ademais da prevenção dela.

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