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domingo, 15 de abril de 2018

Inimigo invisível

Por Antonio Carlos Lua

O grampo ilegal continua sendo um tema espinhoso e delicado no Brasil, onde mais de 600 mil pessoas estão com o telefone grampeado fora dos limites da lei, ou seja, de forma clandestina, sem autorização judicial, ficando vulneráveis a uma perigosa rede de chantagem, extorsão, intimidação e constrangimento da qual é difícil escapar, pois a luta é contra um inimigo invisível.

Assim como no filme “A Vida dos Outros”, na clássica obra “1984”, de George Orweell” , a vida privada, também, praticamente inexiste no Brasil, onde fazer escutas clandestinas faz parte do dia-a-dia dos criminosos, que não deixam vestígios nem impressões digitais.

A prática de chantagem, extorsão e outros crimes graves cria um clima de terror, que se projeta na promiscuidade das sombras, controlando o que se passa, vendo sem ser visto, gerando o medo, que como dizia o escritor e contista, Guimarães Rosa, é uma pressa que vem de todos os lados. Ou seja, é um medo generalizado de todos em relação a todos.

Grampear clandestinamente conversas telefônicas no Brasil se tornou tão corriqueira que é comum encontrar anúncios em jornais dos grandes centros do país em que agências de detetives prometem revelar tudo que seus clientes desejem conhecer, incluindo as anedóticas suspeitas de infidelidade conjugal.

Vivemos um período de perda de parâmetros e de princípios. Não se respeita o direito à privacidade. Chegamos a um ponto em que até as instituições máximas do país ficam sob ameaça.  

O país perdeu sua compostura. Caímos num Estado de bisbilhotagem incompatível com os próprios fundamentos da civilização, que se constitui uma grave ameaça ao Estado Democrático de Direito. 

O grampo ilegal é um retrocesso imensurável para uma nação que se diz livre e democrática. Como disse, em certa ocasião, o jurista e membro da Academia Brasileira de Letras, Celso Lafer, o direito à vida privada é uma das vertentes da liberdade.

Essa liberdade enseja a cada ser humano – dentro dos limites de um Estado Democrático de Direito – uma porção de existência independente do controle social. 

Um dos meios jurídico-políticos de garantir essa liberdade é o combate à ilícita espionagem secreta que a ameaça.

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