Por Antonio Carlos Lua
A luta das mulheres pelos seus direitos tem natureza universal com
esforços coletivos de todos que se preocupam com os direitos humanos. A
história testemunha que nenhum ser humano sofreu tanta opressão e violência em
tão longo tempo como as mulheres, numa feroz exclusão do gozo das mais básicas
garantias, sendo elas estigmatizadas com os mais sinistros símbolos
desabonadores, negativos e hostis.
Mesmo com a Constituição de 1988 – que incorporou cerca de 90% das
reivindicações do segmento feminino, consolidando um aparato normativo que é
referencial no tocante ao direito das mulheres – as estatísticas não apontam
resultados concretos que indiquem redução na espiral de desigualdade, que
coloca o segmento feminino em situação desfavorável no Brasil.
A atual Carta Magna é perfeita quanto ao tratamento dos sexos com
igualdade, inclusive nas questões familiares, que ganharam reforço com as
alterações no Código Civil, de 2002, cujo texto substituiu a norma de 1916. As
pequenas reformas feitas no Código Penal nos últimos anos também extinguiram
inúmeros dispositivos que diminuíam ou subjugavam a figura feminina.
Mesmo assim, o regramento constitucional não tem impedido o agravamento da desigualdade entre homens e mulheres na sociedade brasileira. Isso ainda ocorre devido às práticas excludentes que permanecem operando sobre as mulheres, reflexo de uma visão conservadora e de um modelo de cidadania que ainda privilegia a imagem masculina no espaço público.
Mesmo assim, o regramento constitucional não tem impedido o agravamento da desigualdade entre homens e mulheres na sociedade brasileira. Isso ainda ocorre devido às práticas excludentes que permanecem operando sobre as mulheres, reflexo de uma visão conservadora e de um modelo de cidadania que ainda privilegia a imagem masculina no espaço público.
Os registros históricos apontam que, por séculos, as mulheres foram
equiparadas por ascetas ao pecado, sendo consideradas instrumentos do diabo
para propagar o pecado mortal na Terra. Vistas como “bruxas” muitas delas eram
queimadas num castigo mortal.
No século XVII, foram queimadas mais de um milhão de mulheres acusadas de bruxaria. Mutiladas em países da África com a supressão do clitóris, censuradas em países islâmicos onde são proibidas de exibir o rosto, subjugadas como escravas e prostitutas em regiões da Ásia, deploradas como filha única por famílias chinesas, são as mulheres que carregam o maior peso da opressão e violência no mundo.
No século XVII, foram queimadas mais de um milhão de mulheres acusadas de bruxaria. Mutiladas em países da África com a supressão do clitóris, censuradas em países islâmicos onde são proibidas de exibir o rosto, subjugadas como escravas e prostitutas em regiões da Ásia, deploradas como filha única por famílias chinesas, são as mulheres que carregam o maior peso da opressão e violência no mundo.
Na antiguidade clássica e até muito recentemente, as mulheres eram
excluídas da cidadania, preenchendo uma categoria odiosa de pré-cidadãs ou
cidadãs incompletas dentro de um conceito de cidadania restritiva. Na antiga
Grécia, as mulheres, juntamente com os metecos (estrangeiros) e os escravos,
não se incluíam no raio de abrangência da cidadania.
Num país instável como o Brasil – que vem negando ainda muitos direitos às mulheres – a cidadania feminina não conseguiu ser um parâmetro invariável da democracia, mostrando que esta ainda não foi plenamente conquistada.
Num país instável como o Brasil – que vem negando ainda muitos direitos às mulheres – a cidadania feminina não conseguiu ser um parâmetro invariável da democracia, mostrando que esta ainda não foi plenamente conquistada.
As relações desiguais de poder em que estiveram e ainda estão implicados
homens e mulheres fogem às marcas de gênero para situarem-se no plano da
violação dos direitos fomentada pela injustiça cultural dos preconceitos,
estereótipos e padrões discriminatórios, que constroem a identidade de homens e
mulheres, atribuindo-lhes diferentes papéis na vida social, política,
econômica, cultural e familiar.
A violenta desigualdade entre homens e mulheres nesse cenário injusto
compromete a democracia e penaliza a sociedade em todos os níveis de
desenvolvimento. O que as mulheres buscam hoje é a igualdade de direitos –
direitos humanos, direitos constitucionais legítimos, direito ao respeito, à
dignidade, à educação, à moradia, à saúde, ao trabalho, à cultura, à cidadania,
que devem ser buscados incansavelmente.
Não é possível fechar os olhos para a realidade perversa que as mulheres
herdaram, desde a longínqua história das civilizações, nascendo sob a égide de
um chefe de família, um todo poderoso homem, e segue violentada em seus
direitos, sofrendo, ainda em 2018, violência física e psicológica.
É preciso uma tomada de consciência radical por parte da sociedade.
Todos devem se engajar na luta contra esse flagelo milenar. As injustiças e
estereótipos presentes no Brasil impedem as mulheres de exercer suas
liberdades, fazer suas próprias escolhas, controlar os próprios corpos e as
próprias vidas e de participar de decisões que definem o curso da sociedade, da
mesma forma que os homens fazem.
Embora as mulheres estejam reagindo para mudar o atual cenário, buscando
suas vozes e reunindo sua coragem contra aqueles que agem de maneira predatória
contra o segmento feminino com velhas e novas práticas – visíveis e invisíveis
– a realidade desse segmento ainda não alcançou o marco constitucional ideal,
pois os braços do Estado no Brasil ainda não neutralizaram as profundas
tradições culturais que continuam relegando as preocupações das mulheres a um
plano secundário, sendo este um desafio crítico no país.
Apesar de tudo, as mulheres, como fruto das suas lutas, alcançaram grande visibilidade social, que se traduziu em importantes avanços. Porém, é importante ressaltar que mesmo com as conquistas alcançadas é necessário uma constante vigilância, uma vez que desigualdades de gênero, classe, raça e etnia ainda permeiam a sociedade brasileira, que precisa estar cada vez mais consciente dos mecanismos legais e das políticas disponíveis para a efetivação dos direitos das mulheres.
Enquanto o Brasil não aprimorar suas políticas sociais, os obstáculos
que inviabilizam o pleno exercício da cidadania das mulheres continuarão
criando impasses, uma vez que os conceitos normativos relacionados a gênero não
se modificaram. Os livros do passado e do presente seguem utilizando uma
linguagem masculina, ocidental e branca.
Os debates de gênero ocupam um lugar marginal nos livros, sendo um fator
para aniquilar direitos. Pertencer à espécie humana deveria ser o único
critério para a titularidade de direitos humanos. No Brasil, entretanto, não
existe uma justaposição entre ser humano do ponto de vista biológico e ser sujeito
de direitos.
Há muita coisa a resolver quanto a essa questão no Brasil, que é o
quinto país que mais mata mulheres no mundo. Infelizmente, o critério de sexo
no país vem demarcando a menos valia das mulheres traçando, assim, um caminho
de menor titularidade.
A solução do problema deve ocorrer dentro dos mecanismos do Estado Democrático de Direito, com a premissa de que homens e mulheres se equivalem em direitos e obrigações. No caso em questão, não vale apenas a indignação temporária. Continuar virando as costas para o que acontece com as mulheres não é uma resposta plausível diante da grande escala de violência e da devastadora violação de direitos do segmento feminino.
A solução do problema deve ocorrer dentro dos mecanismos do Estado Democrático de Direito, com a premissa de que homens e mulheres se equivalem em direitos e obrigações. No caso em questão, não vale apenas a indignação temporária. Continuar virando as costas para o que acontece com as mulheres não é uma resposta plausível diante da grande escala de violência e da devastadora violação de direitos do segmento feminino.
Mesmo neste cenário desfavorável, há de reconhecer, no entanto, que cada
vez mais surgem pautas de reivindicações de mulheres para garantir o efetivo
combate à violência de gênero e à igualdade em representatividade no país. O
avanço dessas demandas tornou possível, inclusive, a realização de tratados,
para levar o Brasil a alcançar um padrão mínimo em relação aos direitos das
mulheres.
Mesmo privadas ao longo dos séculos do exercício pleno da cidadania e
submetidas a abusos, as mulheres têm conseguido exercer papel relevante na
ampliação dos seus direitos, com a consciência de que o avanço da participação
feminina nas esferas da vida social e política são importantes para que
possamos construir uma sociedade mais justa, mais fraterna, mais humana.
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