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domingo, 26 de novembro de 2023

Um imperativo humanitário


ANTONIO CARLOS LUA

Uma ameaça intolerável paira hoje sobre a paz mundial. O mundo inteiro está se desintegrando numa orgia de violência e barbaridades com massacres em massa, genocídios e terríveis limpezas étnicas e religiosas, descumprindo-se acordos diplomáticos e regramentos de Direito Internacional. Foi-se por terra a missão de conter a violência e de promover regras estáveis intercontinentais para que as nações pudessem se dedicar às artes da paz, com o crescimento econômico, a valorização da cultura, das liberdades políticas e a promoção dos direitos individuais e coletivos. Essa grande arquitetura institucional internacional está, infelizmente, ruindo.

Os valores supremos de liberdade e democracia estão violentamente ameaçados de cair numa nova idade das trevas, com guerras cada vez mais cruéis e sangrentas num nível de violência sem precedentes, tendo como principais vítimas desta nova Idade Média os mais fracos, ou seja, as populações dos países pobres e emergentes. Em contraposição à paz, os países em todo o planeta se armaram como nunca nas últimas décadas, mostrando que tudo pode acontecer quando existe a ameaça de uso de armas nucleares em conflitos de alta intensidade entre países em várias regiões do mundo.

Essa realidade bélica é um dos fantasmas que ameaça a paz e o sistema internacional com o imenso arsenal de guerra que hoje funciona como uma bomba relógio pronta para explodir, trazendo implicações devastadoras para toda a humanidade, desconsiderando as obrigações de tratados internacionais. Enquanto existirem armas nucleares, a possibilidade de seu uso não pode ser descartado com o arsenal nuclear em muitos países ameaçando a humanidade. Hoje existem cerca de 13.000 arsenais nucleares entre táticos e estratégicos, principalmente nos Estados Unidos, com 5.428 armas nucleares, e na Rússia com 5.977.

O restante está presente na China, com 350 armas nucleares, Grã-Bretanha, com 225, França com 290, Índia com 160, Paquistão com 165, Israel com 90 e Coreia do Norte com 20 armas nucleares. A Rússia tem 1.912 ogivas táticas ou de teatro, não instaladas e presentes em depósitos. Do lado norte-americano são cerca de 200, das quais metade em depósitos no exterior.

Outras 100 armas nucleares estão em bases europeias na Itália, Bélgica, Holanda, Alemanha e Turquia. A diferença numérica das ogivas táticas deve-se às escolhas ligadas às diferentes posições geopolíticas das duas superpotências – ou seja – a Rússia e os Estados Unidos. Desde a época da Guerra Fria existe a chamada cláusula do no ‘first-use’, que é o compromisso de não usar a arma nuclear. Mas, no entanto, sabemos que os arrogantes donos dessas armas podem usá-las quando quiserem. Segundo uma estimativa da Universidade de Princeton, dos Estados Unidos, uma guerra nuclear global em poucas horas levaria a 90 milhões de mortes.

O quadro é apocalíptico. Os efeitos de Chernobyl e Fukushima nos dão uma ideia das consequências de uma guerra nuclear. Uma realidade que se torna terrivelmente concreta é que a guerra que se desenvolve agora no coração da Europa é uma tragédia e não pode cruzar o limiar nuclear se constituindo uma catástrofe para a humanidade.

Todos os países que detêm armas nucleares estão aumentando ou potencializando seus arsenais. Cerca de 9.440 ogivas das 12.705 existentes no início de 2022 estão em condições de uso potencial. Mais de 3.732 delas estão acopladas a mísseis e aeronaves. Cerca de 2 mil – quase todas pertencentes à Rússia ou aos EUA – são mantidas em estado de alerta operacional máximo.

Rússia e Estados Unidos possuem conjuntamente mais de 90% de todas as ogivas, mas a China está no meio de uma expansão substancial de seu arsenal nuclear que, de acordo com algumas imagens de satélite, inclui a construção de mais de 300 novos silos para mísseis.Desta forma, se reforça o letal paradigma do ‘dominus’ – senhor e dono – contrapondo a alternativa de fraternidade proposta pelo Papa Francisco em sua encíclica ‘Fratelli Tutti’, inspirado no melhor homem do Ocidente, chamado Francisco de Assis.

Essa obsessão fez com que ocorressem duas grandes guerras no Século XX com 100 milhões de vítimas. Hoje, quando exaspera a arrogância dos que defendem a guerra, constatamos que há suficientes loucos no Pentágono e na Rússia com a razão tornada irracional, enlouquecida e suicida, cavando a nossa própria sepultura.

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