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domingo, 10 de março de 2019

Quem foi de aço nos anos de chumbo

Antonio Carlos Lua

A Estação Primeira Mangueira – a tradicional verde e rosa do Carnaval carioca – trouxe a memória dos heróis brasileiros marginalizados para a Sapucaí, no Rio de Janeiro.

Os versos do samba-enredo fazem memória a “quem foi de aço nos anos de chumbo”. Em outros tempos bicudos, o escritor, ensaísta e dramaturgo brasileiro, Oswald de Andrade, certamente afirmaria que “a alegria é a prova dos nove!”. 

A verdade é que se a nossa atual política causa espanto mundo afora, o Carnaval continua sendo nosso apogeu estético e – por que não, político – onde as feridas de um país machucado sangram sob os pés dos passistas, que no esplendor de sua arte popular revelam o Brasil da diversidade étnica, religiosa e cultural.

Dos versos do samba-enredo da Estação Primeira Mangueira – “História para ninar gente grande” – sobram referências à história oficial que é colocada em contraste com as violações às mulheres, à população negra e à personagens marcantes como Dandara.

Mulher guerreira, obstinada por liberdade, Dandara – mulher de Zumbi com quem teve três filhos – se suicidou, em 1694, para não voltar novamente à condição de escrava. Até hoje não se sabe a sua verdadeira origem. Não há registro histórico que confirme se ela nasceu em terras brasileiras ou na África. 

Presume-se que sua ascendência tem ligação com a nação africana de Jeje Mahin, culto dos Voduns da região Mahi a noroeste de Abomei. Dentre os daomeanos escravizados, uma mulher chamada Ludovina Pessoa, natural da cidade Mahi foi escolhida pelos Voduns para fundar três templos na Bahia.

No dia em que Zumbi teve a cabeça decepada num golpe à resistência negra, um ano e nove meses já teriam transcorrido desde a morte igualmente trágica de Dandara, face feminina do Quilombo de Palmares, que se tornou um importante símbolo da resistência à escravatura.

Além de Dandara, existiram outras mulheres guerreiras no tempo da escravidão, a exemplo de Maria Felipa – heroína da independência da Bahia e, por conseguinte, do Brasil – e Luísa Mahin, líder dos Malês e participante da Sabinada. 

Porém, o olhar racista dos livros didáticos ignoram e não reconhecem o papel dessas mulheres, cuja história é diretamente associada à resistência protagonizada pelo povo negro durante mais de 400 anos de escravidão. 

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