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domingo, 5 de outubro de 2025

A disputa que molda o século XXI

Antonio Carlos Lua

Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos consolidaram-se como a maior potência do planeta, liderando não apenas pelo seu poderio militar, mas também pela força econômica, tecnológica e cultural. O século XX foi marcado pela consolidação dessa hegemonia norte-americana, que encontrou no período da Guerra Fria sua expressão mais contundente. Após a queda da União Soviética, em 1991, os Estados Unidos emergiram como potência unipolar, influenciando diretamente a política internacional, os organismos multilaterais e o mercado global.

No entanto, o século XXI trouxe mudanças significativas. A China — que durante décadas viveu sob uma economia planificada e fechada — passou por uma transformação profunda a partir das reformas de Deng Xiaoping, nos anos 1980. O país combinou controle político centralizado com abertura gradual ao mercado, tornando-se, em poucas décadas, a segunda maior economia do mundo. Hoje, a China disputa diretamente com os Estados Unidos não apenas o protagonismo econômico, mas também tecnológico, geopolítico e militar.

Enquanto os Estados Unidos mantêm sua influência através de alianças históricas como a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) na supremacia no setor financeiro e no domínio de cadeias produtivas globais, a China vem ampliando sua projeção por meio da ‘Nova Rota da Seda’ em um ambicioso projeto de infraestrutura e comércio que conecta Ásia, África e Europa.

Além disso, a China lidera em áreas estratégicas, como a produção de semicondutores, a expansão da inteligência artificial e a corrida pelo 5G, posicionando-se como rival direto de Washington. O embate entre essas duas potências vem tendo reverberações em todo o globo. No campo militar, os Estados Unidos ainda detêm o maior orçamento de defesa do mundo e bases militares espalhadas em diversos continentes.

A China, por sua vez, acelera a modernização de suas forças armadas, especialmente no Indo-Pacífico, onde busca firmar sua influência em regiões disputadas, como o Mar do Sul da China e Taiwan — ponto sensível de tensão com Washington. No aspecto político-diplomático, os Estados Unidos continuam sendo referência para democracias liberais, mas sua imagem internacional vem sendo questionada diante de crises internas e de ações intervencionistas em diferentes países do mundo.

Já a China procura projetar uma narrativa de alternativa ao modelo ocidental, apostando em parcerias estratégicas no Sul Global e em blocos como os BRICS – fórum de cooperação entre um grupo de grandes economias emergentes, fundado pelo termo criado em 2001 pelo economista Jim O'Neill para se referir a Brasil, Rússia, Índia e China, os quais buscam hoje fortalecer uma ordem multipolar.

A disputa entre Estados
Unidos e a China, portanto, não é apenas pelo domínio econômico, mas pelo futuro da governança mundial. Trata-se de um confronto de modelos. De um lado, a tradição liberal-

democrática, ainda que abalada por contradições. De outro, um sistema autoritário de partido único, que combina crescimento acelerado com rígido controle político. O resultado desse embate será decisivo para definir o século XXI.

Se, no passado, o mundo viveu sob a lógica da bipolaridade EUA-URSS e, em seguida, sob a hegemonia unipolar norte-americana, hoje o cenário aponta para um equilíbrio instável, onde a ascensão chinesa desafia diretamente a ordem internacional estabelecida. Sendo assim, a questão que permanece é se esse confronto evoluirá para uma coexistência competitiva ou para uma ruptura mais drástica, com impactos imprevisíveis para o futuro global.

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