A controvérsia sobre
a liberdade de imprensa e expressão e a preservação da intimidade e da imagem –
dois direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal – chega ao
Supremo Tribunal Federal (STF) na polêmica ação que trata do ‘direito ao esquecimento’,
ou seja, o direito de uma pessoa requerer a retirada definitiva de dados
pessoais que sejam considerados indevidos ou prejudiciais à sua imagem, honra e
nome, de qualquer veículo de comunicação de massa.
O STF reconhece que a
missão é espinhosa e está buscando um equilíbrio virtuoso para deixar que as
liberdades garantam a dignidade, mas que a liberdade de um não se sobreponha à
de todos os outros, de tal maneira que não tenhamos mais condições de saber
qual é a nossa história, qual é o nosso passado.
O que a Suprema Corte
de Justiça do país vai analisar é o que é a memória de alguém, que precisa ser
resguardada e não pode ser discutida, e o que não pode ser guardado porque
constitui não memória individual, mas memória coletiva.
O resultado do julgamento no STF terá reflexos sobre os casos semelhantes – a chamada repercussão geral – definindo um entendimento único, que deverá ser seguido pelo Judiciário em todo o Brasil.
O resultado do julgamento no STF terá reflexos sobre os casos semelhantes – a chamada repercussão geral – definindo um entendimento único, que deverá ser seguido pelo Judiciário em todo o Brasil.
Há três linhas
jurídicas de pensamento bem delineadas na discussão do tema. Os juristas que
são contra o direito ao esquecimento dizem que – além de não constar
expressamente na legislação brasileira – esse direito não poderia ser extraído
de qualquer direito fundamental, nem mesmo do direito à privacidade e à
intimidade.
Assim, um direito ao esquecimento seria, ademais, contrário à memória de um povo e à própria História da sociedade. A liberdade de informação prevaleceria sempre e a priori, à semelhança do que ocorre nos Estados Unidos.
Assim, um direito ao esquecimento seria, ademais, contrário à memória de um povo e à própria História da sociedade. A liberdade de informação prevaleceria sempre e a priori, à semelhança do que ocorre nos Estados Unidos.
Na defesa desse
posicionamento, é importante invocar a jurisprudência mais recente do Supremo
Tribunal Federal, especialmente o célebre precedente das biografias não
autorizadas (ADI 4815), quando a Corte, por unanimidade, declarou inexigível a
autorização prévia para a publicação de biografias, em consonância com os
direitos fundamentais à liberdade de expressão da atividade intelectual,
artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença
de pessoa biografada.
De forma geral, vale
argumentar que o direito ao esquecimento é desnecessário no Brasil, que já
possui garantias constitucionais que protegem a honra, sendo a lei atual
suficiente para proteger os chamados direitos de personalidade, isto é, a
dignidade da pessoa, nos aspectos físicos, psíquicos e morais.
Entretanto, em
contraposição a esse entendimento, os defensores do direito ao esquecimento
apontam que ele não apenas existe, como deve preponderar sempre, como expressão
do direito da pessoa humana à reserva, à intimidade e à privacidade.
A alegação é de que
na esteira da cláusula geral de tutela da dignidade da pessoa humana – valor
supremo na ordem constitucional brasileira – esse direito prevaleceria sobre a
liberdade de informação acerca de fatos pretéritos, não atuais.
Argumentam que entender o contrário seria rotular o indivíduo, aplicando “penas perpétuas” por meio da mídia e da internet.
Argumentam que entender o contrário seria rotular o indivíduo, aplicando “penas perpétuas” por meio da mídia e da internet.
Os juristas dessa
corrente amparam-se na decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça
(STJ), em 2013, no caso da Chacina da Candelária, no qual aquela Corte
reconheceu um direito ao esquecimento que definiu como “um direito de não ser
lembrado contra sua vontade” (REsp 1.334.097/RJ).
Aludem, ainda, à experiência européia que – em tese jurídica contrária à experiência norte-americana – inclina-se pela prevalência do direito ao esquecimento.
Aludem, ainda, à experiência européia que – em tese jurídica contrária à experiência norte-americana – inclina-se pela prevalência do direito ao esquecimento.
Os precedentes desse
direito estão na ideia de que, por exemplo, um indivíduo que tenha cumprido
pena na prisão não seja prejudicado por isso ao procurar um emprego e se
reinserir na sociedade, uma vez que seu nome pode ser encontrado em poucos
cliques nos motores de busca do Google, aparecendo, fatalmente, a notícia sobre
sua condenação.
Na discussão do
polêmico tema, surgem, no entanto, juristas que assumem uma posição
intermediária, com o entendimento de que a Constituição Federal não permite
hierarquização prévia e abstrata entre liberdade de expressão e privacidade, da
qual o direito ao esquecimento seria um apenas um desdobramento.
Enfatizam que –
figurando ambos como direitos fundamentais – não haveria outra solução tecnicamente
viável que não a aplicação do método de ponderação, com vistas à obtenção do
menor sacrifício possível para cada um dos interesses em colisão.
Defendem também que o tema não pode ser tratado de forma binária, já que existe uma grande margem entre o sim e o não para aplicação do direito ao esquecimento.
Defendem também que o tema não pode ser tratado de forma binária, já que existe uma grande margem entre o sim e o não para aplicação do direito ao esquecimento.
O Supremo Tribunal
Federal, por meio de audiências públicas, reuniu todos os subsídios para
julgar, com equilíbrio, o caso em análise. Uma coisa é certa: estaremos diante
de um julgamento que será difícil de esquecer.
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