Antonio Carlos Lua
O posicionamento do Papa Francisco nas questões ligadas à democracia, justiça social, economia, meio ambiente e globalização tem gerado reações no mundo midiático que faz pouco esforço para compreender o que é que sustenta verdadeiramente o pontífice.
Impõe-se a Francisco – primeiro Papa latino-americano, primeiro pontífice não europeu em mais de 1.200 anos e o primeiro Bispo de Roma jesuíta da história – o clichê pouco concentrado nos dogmas de fé, acusando ele de dedicar-se muito à denúncia dos males terrenos.
Aqueles com gostos pelos paradoxos definem Francisco como o melhor líder da esquerda, reforçando o discurso dos ultraconservadores que acham o Papa demasiadamente político.
Qualquer pessoa que analisar a postura do pontífice perceberá que os seus argumentos e suas as críticas têm um fio condutor.
Não é absurdo o Papa dizer que a única força que agora parece governar o mundo é a busca do lucro, quando qualquer manifestação humana é submetida ao “deus dinheiro”.
Hoje, o poder da riqueza foge de todas as regras, expandindo-se sem controle e determinando muitas injustiças. Bilhões de seres humanos são lançados na miséria pelo egoísmo de poucos.
Todos sabem que o sistema econômico atual é uma gangrena que – mesmo maquiada – mais cedo ou mais tarde seu mau cheiro será sentido, com a fraude moral daqueles que ignoram os que estão em sofrimento.
Quando se produz a bancarrota de um banco, imediatamente aparecem somas escandalosas para salvá-lo, mas quando se produz esta bancarrota da humanidade não há nem uma milésima parte para salvar os cidadãos que sofrem.
Temos um sistema cruel que escraviza, rouba, fere, ameaça e abate os pobres como gado até onde o dinheiro quer.
O terrorismo de base que emana do controle do dinheiro nos ameaça a todo instante com a tirania semeado na sociedade que alimenta a exclusão, a opressão, a desigualdade e a violência econômica e social, gerando cada vez mais miséria numa espiral que parece não acabar nunca.
Os governantes olham para aqueles que estão na miséria sem tocá-los, adotando um discurso repleto de eufemismos, mas sem fazer nada para resolver efetivamente os problemas sociais.
Esta atitude hipócrita expressa a ausência de compromisso com a sociedade. O desemprego é real, a violência é real, a corrupção é real, o esvaziamento da democracia é real.
Com o ecossistema destruído pela exploração selvagem dos recursos naturais e com uma paz ameaçada em sua raiz pelos mercadores de armas cada vez mais destrutivas, temos povos culturalmente colonizados pelo pensamento único liberal e individualista.
Que mal há em dizer que a única origem desses males é a tirania do capital?
A questão não é ser contra o livre mercado, contra o capitalismo, mas sim ser contra seus excessos, principalmente na América Latina, que continua sendo o “terceiro mundo”, como definia o saudoso jornalista Neiva Moreira, que por muito tempo cobriu o processo de desenvolvimento nos países latino-americanos como editor da revista “Cadernos do Terceiro Mundo”.
Ninguém vê com suspeita os empresários. O que não se admite é a especulação financeira, concorrência desleal, sonegação – estes sim comportamentos completamente indiferente ao destino da sociedade.
Denunciar a raiz humana da crise ecológica e pedir para parar o crescimento baseado na espoliação do planeta não é querer voltar ao tempo das cavernas.
Nenhuma visão cristã pode ser passiva ao ponto de não dizer que o mundo está à beira do suicídio e corre o risco de nele cair se não mudar decisivamente de rota e enfrentar os problemas ligados às mudanças climáticas, fruto do atual modelo de desenvolvimento.
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